AS REVOLTAS SEPARATISTAS NO CONTEXTO DE CRISE DO PACTO COLONIAL

O século XVIII no Brasil foi marcado pela crise do sistema colonial mercantilista no plano da História Geral e por contradições entre os interesses de colonos e metrópole. As próprias revoltas nativistas (localizadas e sem demandas por emancipação política) demonstram que a insatisfação com relação ao sistema colonial eram patentes.

Com a Revolução Industrial e com a perda de um importante colônia (as Treze Colônias, atual Estados Unidos da América), a Inglaterra passou a incentivar movimentos de independência ao redor do mundo, a fim de ampliar seu mercado consumidor. Esse apoio tornava propício o clima para revoltas separatistas no mundo todo.

Além disso, o declínio da mineração levou à ascensão da produção agrícola, o que era favorável para o Brasil colonial, uma vez que a população europeia tinha aumentado e a demanda por suprimentos era grande. Porém, Portugal intensifica ainda mais o pacto colonial, o que limita cada vez mais a economia brasileira.

A Inconfidência Mineira (1789)

No século XVIII, vimos que a exploração colonial chega a seu auge. Com o esgotamento das jazidas de ouro e diamantes, os colonos eram acusados de contrabando e fraude, o que fez com o ministro português Pombal criasse a derrama (1765).

A derrama estabelecia uma cota de 100 arrobas (1,5 t) de ouro por ano a ser atingida pelos extratores. Sendo essa cota impossível de se alcançar no contexto de declínio da economia aurífera, os pertences dos mineradores seriam confiscados, até que se completasse a quantia devida.

Somando-se a isso, em 1785, D. Maria I cria um alvará que proíbe a produção de manufaturas no Brasil, obrigando os colonos a importar os manufaturados exclusivamente de Portugal. Isso, além de colocar a colônia num plano de dependência crescente com relação à metrópole, acirrou os ânimos na sociedade colonial.

A notícia do sucesso da independência dos Estados Unidos e o contato com as ideias liberais/iluministas fizeram com que os questionamentos sobre a pacto colonial aumentassem.

Era comum que os filhos das ricas famílias coloniais fossem estudar no exterior. Lá eles tomavam contato com as ideias iluministas que pregavam algo completamente diferente do que a realidade colonial transparecia.

Com exceção de Tiradentes, todos os envolvidos na Inconfidência Mineira eram ricos. para eles, a independência era crucial, uma vez que deixaria de impor limites a seu lucro.

Os rebeldes defendiam o fim do pacto colonial e o desenvolvimento de manufaturas têxteis e da produção agrícola. Não havia consenso sobre a regime político a ser adotado: uns queriam a república; outros, a monarquia constitucional. Mas em um ponto eles não divergiam: o questão do fim da escravidão não era sequer vislumbrada. Poucos, além de Tiradentes, defendiam os escravos, já que a maioria rica via neles a maximização de seus lucros. Extraía-se do Iluminismo apenas os pontos que eram favoráveis aos anseios da elite colonial  deixando pontos como este à margem das decisões.

O movimento não foi bem sucedido, uma vez que os rebeldes se limitavam a discutir a portas fechadas sobre seus planos, até que houve uma delação. Joaquim Silvério dos Reis, devedor de grandes quantias aos cofres reais, delatou o movimento e obteve perdão de sua dívidas. Avisado da conspiração, o então governador da capitania de Minas Gerais, Visconde de Barbacena, suspendeu a derrama e ordenou a perseguição dos envolvidos: a devassa.

A devassa, perseguição aos suspeitos de conspiração, durou cerca de 3 anos. A sentença final resumiu que Tiradentes assumira a culpa pela conjuração, muito provavelmente, a fim de aliviar a participação de seus companheiros.

"A Sentença de Tiradentes", tela de Pedro Américo.

D. Maria I condenou-o à violenta punição exemplar: Tiradentes seria enforcado, esquartejado, teria sua cabeça exposta em Vila Rica (atual Ouro Preto), as demais partes do seu corpo esquartejado seriam colocadas nos postos em que teriam-se dado suas infames práticas, e sua casa seria salgada, uma forma de expurgar para sempre a imagem do mártir da Inconfidência. Ele serviria, portanto, de exemplo para que um movimento similar jamais voltasse a acontecer.

Nas imagens que adicionei a esse post, vemos que Tiradentes se assemelha a Jesus Cristo (o Jesus Cristo europeizado). Não é por acaso. Ambos foram mártires: Jesus, dos cristãos; Tiradentes, dos inconfidentes. A História tratou de se redimir com o líder da Inconfidência Mineira, e ele passou a ser visto como herói. Temos, inclusive, um feriado no dia 21 de abril em sua homenagem, lembrando que o dia seguinte (22 de abril) é a data do "descobrimento" do Brasil e não é feriado.

"Tiradentes Esquartejado", de Pedro Américo.

 A pena para os demais envolvidos foi branda ou inexistente. O movimento, apesar do caso Tiradentes, não foi o único que pediria a emancipação política do Brasil colonial...

Bandeira dos inconfidentes, com o triângulo verde que demonstra influência da maçonaria. A cor vermelha foi adotada posteriormente por ser símbolo mór das revoluções.



A Conjuração Baiana (1798)

Esse movimento apresenta características especiais: diferente da Inconfidência Mineira, a Conjuração Baiana teve liderança das camadas populares do Brasil colonial, como negros livres, mulatos e escravos. A participação de muitos alfaiates fez com que também fosse conhecido Revoltas dos Alfaiates.

Além disso, seus objetivos foram além da demanda de liberdade e independência, sendo muito mais amplos. Propunham-se medidas que revolucionariam a estrutura da sociedade colonial, como igualdade de cor, fim da escravidão, abolição de qualquer tipo de privilégio.

Com o aumento da produção agrícola no final do século XVIII, a prosperidade beneficiou apenas os grandes proprietários de engenhos e comerciantes. A escassez de suprimentos gerou alta dos preços, e a diversos motins foram organizados a fim de saquear armazéns, em busca de alimentos.

Já afirmamos que os movimentos de emancipação política no Brasil colonial foram influenciados tanto pelas ideias iluministas quanto pelo sucesso da Revolução Americana, porém, no caso baiano, outro acontecimento externo serviu de exemplo contra a opressão: a queda da Bastilha, em 1789, marco do início da Revolução Francesa, que acabou com a Antigo Regime no país.

Além da Revolução Francesa, outro episódio marcante da história do século XVIII foi crucial para que a Conjura se concretizasse: a independência do Haiti, liderada pela maioria negra da antiga colônia francesa situada nas Antilhas, que culminou na expulsão dos brancos da ilha. O Haiti foi a segunda colônia a se desvencilhar do domínio metropolitano ( a primeira foi os EUA), por isso acredita-se que tal notícia teria inflamado os negros a aderir ao movimento.

Toussaint de Louverture, líder da
Independência do Haiti.

Apesar do posicionamento favorável á separação de Portugal, os rebeldes não chegaram a contestar a dominação interna da colônia, uma vez que parte da elite baiana fazia parte do movimento.


Entre os revoltosos, podemos destacar a presença de Moniz Barreto, professor que semeava o ideal revolucionário entre negros e mulatos, Cipriano Barata, médico e ativo propagandista da Conjuração, João de Deus, mulato e alfaiate, Luiz Gonzaga das Virgens e Lucas Dantas, organizadores.

Na manhã de 12 de agosto de 1798, a sociedade baiana lia a seguinte mensagem nas paredes e nos muros: "Animai-vos, povo baiense, que está por chegar o tempo feliz da nossa liberdade, o tempo em que seremos irmãos, o tempo em que seremos todos iguais.". O movimento também não obteve sucesso, uma vez que sofreu violenta repressão (seis dos condenados foram mortos, os demais foram degredados ou aprisionados), tendo a Coroa concedido prêmios em dinheiro, privilégios e cargos importantes àqueles que denunciassem os chamados crimes de lesa-majestade.






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